Dormitava, numa sonolência estranha, na cadeira dura de plástico…ouvia ao longe, a voz, metálica
Senha C, balcão 3 e no placar o número a verde 326.
E o meu sono a confundir-se com o pano de cozinha bordado a ponto cruz, linha azul, furado com uma agulha por entre buraquinhos de pano, onde entrei, primeiro a medo, hesitante, e de repente tragada em fúria para as entranhas da baleia, e eu estarrecida a pensar:
Então, não foi o que aconteceu com o Pinóquio?
Sou eu a história, estou nela, e naúfraga num pedaço de casco de navio, à deriva por entre estômago, rins, intestino, longos corredores de intestino, carregados de entulho e peixe podre a cheirar àquele odor característico de uma morte anunciada mas sempre camuflada por antissépticos e desinfectantes.
E a voz metálica
Senha A, balcão 5 e no placar o número 531
E eu a sair da senha A que não é a minha, a nadar com o meu pedaço de casco a entrar por becos e vielas da corrente sanguínea da baleia. Não da Baleia Santa
E nisto, a agulha com o fio azul do ponto cruz suspenso no ar e ela, Santa Maria, mãe de deus, rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte e o Ámen dado, em forma de panfleto, com um não em letras garrafais.
E eu a preferir sair dos becos, a preferir as vielas dos bêbados e putas nas esquinas, o cheiro a vomitado e a sexo, sempre camuflado pelos antissépticos e desinfectantes, encostada ao candeeiro de luz trémula a pensar se seria este o cais e a rejeitar o panfleto do Ámen com o não.
Senha C, balcão 3 e no placar o número a verde 327.
Preciso de encontrar o balcão 3, e a agulha do ponto cruz a mandar-me seguir uma seta que dizia Saída, mas que estava perdida na viela onde o bêbado vomitou bílis verde e a puta riu, um riso sem dentes, gengivas, buracos, os olhos enormes bolas brancas pintadas de rosa choque.
E eu perdida, às voltas por entre vielas de intestinos a pensar na tabuleta saída que me leve até a uma artéria, não daquelas concorridas e cheias de trânsito, uma pouca iluminada, sem cheiro a vomitado, com bêbados e putas mas sem cheiro a vomitado, mas também sem cheiro a antisséptico e desinfectante
Senha E, balcão 1, não vi o número a verde no placar.
E agora?
Santa Maria, mãe de deus, rogai por nós pecadores, a agulha do ponto cruz novamente em suspenso.
E a Santa
E eu às voltas, já não nos intestinos mas na corrente sanguínea da baleia, nos becos, vielas e artérias, sem me orientar para a saída da avenida.
Senha C, balcão 3 e no placar o número a verde
E a voz da agulha suspensa no ar, agora e na hora da nossa morte.
E o Ámen?
Esqueceu-se do Ámen.
E eu a adiar … e as searas do sul ao fundo
E eu de encontro a elas. A sair da baleia, o som de um riso que sempre me preencheu, a voz doce a dizer dói e como dói adie
E eu a adiar…
E a cair num sono profundo
. ...
. ...
. RIP
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ....
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. ...
. R.I.P.
. ...
. ...
. ...
. PARA MIM...PARA MIM...E S...
. PORQUÊ?
. VEM...
. TODOS IGUAIS!!!
. ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE DEFICIENTES
. AMIGA DA PAZ
. AMIGA DA SOLIDARIEDADE
. AMI
. AMIGA DOS ANIMAIS
. PRAVI
. BIANCA
. AMIGA DAS CRIANÇAS
. AMIGA DAS CRIANCAS DESAPARECIDAS
. MADDIE
. AMIGA DE MÃES CORAGEM
. CÉLIA
. MARIA
. FILOMENA
. OUTRAS E OUTROS SEM EIRA NEM BEIRA
. Strange
. Ecoman
. Rititi
. ProZaica
. Alluvium
. Van-Van
. Alfaiate
. Tralha
. Leswork
. Saramago
. ALA
. DIRECTÓRIO DE REVISTAS CIENTÍFICAS
. Latindex
. RedeAlyc
. DOAJ
. SCOPUS
. IBSS
. A SABER SEMPRE ...
. ONDE IR
. CCB
. FCG
. COLISEU
. NÃO DOU TÍTULO